Governo Lula não tem política ambiental clara
Aprovação no Senado de projeto que flexibiliza licenciamento mostra Marina isolada, enquanto Planalto não se manifestou
A aprovação do projeto de lei 2.159 de 2021, por ampla maioria do Senado, evidenciou a falta de unidade do governo Luiz Inácio Lula da Silva (PT) na temática ambiental.
Por se tratar de área na qual o Brasil busca posicionar-se como referência global, dada a extensão de seus biomas e a variedade de manejos nos quais detém expertise, a inconsistência programática é preocupante. Já na segunda metade do mandato e às vésperas da COP30 em Belém, Lula ainda não deixou clara a sua política para o ambiente.
O projeto, que volta para a Câmara dos Deputados, promove um reordenamento do licenciamento ambiental. De fato, o sistema de outorga de autorizações para empreendimentos que afetem ecossistemas precisa ser atualizado, principalmente em busca de simplificação e flexibilidade para impulsionar o desenvolvimento sustentável.
Mas salta aos olhos o peso no texto de demandas políticas, inclusive paroquiais, na organização de uma área que deveria se basear sobretudo na técnica.
Tome-se o caso da Licença Ambiental Especial (LAE) proposta pelo presidente do Senado, Davi Alcolumbre (União Brasil-AP), no mesmo dia da votação.
O dispositivo facilita a concessão de autorização a empreendimentos que sejam considerados estratégicos pelo Conselho de Governo, ligado à Presidência, ainda que façam uso de recurso natural "potencialmente causador de significativa degradação do meio ambiente".
Tal Conselho, recrutado no primeiro escalão, já consta da lei que instituiu a Política Nacional do Meio Ambiente, em 1981, e tem a função de assessorar o Planalto. Com a emenda, expande-se sua função, que passa a incluir "propor obras, serviços, projetos ou atividades para a lista de empreendimentos estratégicos".
A motivação de Alcolumbre é notória: exercer pressão para acelerar o andamento da exploração de petróleo na Foz do Amazonas, que se localiza em seu estado. A empreitada sofre oposição de Marina Silva, ministra do Meio Ambiente, que já se desentendeu com administrações petistas no passado. Já Lula e outras alas de sua gestão o apoiam.
A mesma divisão se viu no projeto que flexibiliza o licenciamento ambiental, aprovado por acachapantes 54 votos a 13 no Senado. O PT até orientou sua bancada a votar contra o diploma, mas o governo não tomou posição. Legendas ao centro e à direita abrigadas na Esplanada dos Ministérios, casos de MDB, PSD, União Brasil, PP e Republicanos, deram votos para a proposta.
Em parte, o cenário reflete a decantada fragilidade da coalizão de apoio a Lula, baseada em interesses fisiológicos, não em repartição efetiva de poder. Mas, na parte mais temerária, reflete também a indefinição da política ambiental —que, embora se apoie na imagem de Marina, não endossa seus posicionamentos nem mesmo se mostra capaz de negociar meios-termos.
Editorial Folha de São Paulo