A nova perícia no corpo da turista brasileiraJuliana Marins, 26, solicitada pela família da jovem por meio da DPU (Defensoria Pública da União), poderá subsidiar uma apuração internacional sobre as circunstâncias da morte dela durante uma trilha no Monte Rinjani, na Indonésia, segundo a defensora regional de direitos humanos no Rio de Janeiro Taísa Bittencourt.
A defensora afirma que, caso fique demonstrado que não houve investigação ou responsabilização pelas autoridades indonésias, o Brasil poderá abrir uma apuração própria, por meio da Polícia Federal, a partir do princípio da jurisdição extraterritorial. "Já pedimos a instauração de um inquérito policial na Polícia Federal para apurar esse eventual cometimento de crime de omissão no abandono da vítima", disse à Folha.
A Polícia Federal não respondeu à reportagem até a publicação deste texto.
Segundo Taísa, no entanto, ainda há incerteza sobre a capacidade técnica de a perícia revelar detalhes relevantes, devido ao estado do corpo. "Os peritos têm dúvidas se vão conseguir efetivamente constatar algo, considerando a deterioração. Mas é desejo da família fazer uma nova perícia com base nas normas e nas leis brasileiras para entender, na nossa cultura, o que efetivamente aconteceu."
A decisão de refazer a autópsia foi confirmada nesta segunda-feira (30) pelo governo federal. A AGU (Advocacia-Geral da União) informou que vai cumprir voluntariamente o pedido da família. O órgão solicitou à Justiça Federal a realização de uma audiência urgente com a DPU e o estado do Rio para definir a forma mais adequada para o novo procedimento.
A audiência foi aceita pela Justiça e deve ocorrer ainda nesta terça (1º).
A companhia aérea Emirates havia informado que o corpo seria transportado para Dubai nesta terça e, posteriormente, para o Rio de Janeiro na quarta. No entanto, na noite desta segunda-feira, a empresa anunciou em nota que o corpo chegará nesta terça-feira (1º) a São Paulo.
A DPU solicitou que o novo exame seja realizado até seis horas após a chegada, no Instituto Médico Legal Afrânio Peixoto, no Rio, com traslado em viatura oficial da Polícia Federal ou da Polícia Civil.
A irmã da brasileira, Mariana Marins, afirmou que a família acionou a DPU com apoio do Gabinete de Gestão Integrada Municipal da Prefeitura de Niterói. "Acreditamos no Judiciário Federal brasileiro e esperamos uma decisão positiva nas próximas horas", escreveu em rede social criada para divulgar informações sobre o caso.
Relatos da imprensa internacional apontam que Juliana pode ter sobrevivido por até quatro dias após o acidente, aguardando socorro. Em laudo preliminar divulgado na sexta-feira (27), um médico legista na Indonésia indicou que ela sofreu trauma contundente, com danos internos e hemorragia, e teria morrido cerca de 20 minutos após um dos impactos. A perícia local estima que a morte ocorreu na terça-feira (24) ou na quarta-feira (25).
Segundo Taísa, a ausência de medidas de segurança na trilha e a possível omissão no resgate estão no centro das dúvidas da família. "A perícia lá fora foi feita com base em outros critérios, outra legislação, e não sabemos ao certo nem quais parâmetros técnicos foram utilizados."
Embora a morte tenha ocorrido no exterior, o caso pode ser apurado pela Justiça brasileira com base no artigo 7º do Código Penal, que prevê jurisdição extraterritorial para crimes praticados contra brasileiros fora do país —desde que a conduta também seja crime no local dos fatos, que o autor esteja no Brasil e que não tenha havido julgamento lá fora.
A defensora afirma que, se comprovada omissão grave, o caso pode ainda ser levado a instâncias internacionais. "Pode ser que isso vá para uma comissão internacional de direitos humanos, se constatado que ela ficou lá quatro dias sofrendo, sem receber o devido socorro."
Enquanto isso, na Indonésia, a polícia da ilha de Lombok, onde fica o vulcão, anunciou nesta segunda-feira que já ouviu testemunhas e inspecionou o local onde Juliana caiu para tentar identificar se houve qualquer tipo de irregularidade na morte dela.
Nesta segunda foram ouvidas quatro testemunhas: um organizador de trekking, um guia local, um carregador de Bayan, Lombok do Norte, e um policial florestal de Ampenan, Mataram, que era responsável pela segurança e proteção na área do Parque Nacional do Monte Rinjani.
Folha de São Paulo