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Troca em ministério é novo arranhão na imagem pró-diversidade do governo Lula

No dia 1º de janeiro de 2023, Lula subiu a rampa do Palácio do Planalto para iniciar seu terceiro mandato disposto a mandar uma mensagem sobre a cara que pretendia dar ao novo governo. Caminhou ao lado de cidadãos que, para ele, representavam a diversidade do povo: duas mulheres (uma cozinheira e uma catadora de papelão), uma criança negra, um operário, um professor, um homem com deficiência física e o cacique Raoni, então com 90 anos.

Dali vieram ministérios inéditos, como o dos Povos Indígenas e o da Igualdade Racial, ou anabolizados, como os de Esporte, Cultura, Direitos Humanos e Mulheres — áreas que no governo Jair Bolsonaro tinham status de secretarias ou eram reunidas em uma única pasta. No comando das estruturas, Lula reforçou a ideia de representatividade: nomeou a primeira indígena ministra (Sonia Guajajara) e colocou um homem negro em Direitos Humanos (Silvio Almeida), uma mulher negra e periférica em Igualdade Racial (Anielle Franco) e uma ex-jogadora de vôlei em Esporte (Ana Moser). Tudo parecia fazer sentido, mas, após mais da metade do mandato, as pastas não só têm resultados muito aquém do planejado, como em alguns casos vêm colecionando fiascos.

Um desses fracassos ganhou um novo capítulo na última segunda-feira, 5, quando o reconhecimento da insuficiência veio do próprio governo. “O presidente Lula quer ver as mulheres mais contentes e protegidas”, declarou a professora Márcia Lopes, após ser anunciada como a nova ministra das Mulheres. O discurso se assemelha ao adotado pela antecessora, Cida Gonçalves, quando assumiu a pasta em janeiro de 2023 — na ocasião, parafraseando Lula, ela afirmou que o Brasil não pode “continuar a conviver com a odiosa opressão imposta às mulheres”. Dois anos e meio depois, tanto a retórica do governo quanto os desafios na proteção às mulheres permanecem os mesmos. A ex-titular entrega à sucessora a árdua tarefa de recuperar um ministério desgastado não só pela falta de resultados, mas também por evidências de má gestão e até por denúncias de assédio moral contra servidoras da pasta.

Os números oficiais indicam que o enfrentamento à violência de gênero pouco avançou neste mandato. Pior: os números subiram em relação às gestões de Bolsonaro e Michel Temer (veja o quadro), chegando a bater um recorde em 2024, com 1 517 casos — dados que causam constrangimento para a gestão que investiu na promessa de “feminicídio zero”. As ocorrências de estupro chegaram a 73 798 vítimas no ano passado, 5,3% a mais que no último ano de Bolsonaro. Olhando para o orçamento da pasta, não é de se espantar que os resultados sejam tão aquém do esperado — entre 2023 e 2024, a verba foi de 467 milhões de reais, mas apenas 104 milhões de reais (22%) foram utilizados, sendo metade disso destinado ao pagamento de salários, benefícios e aposentadorias, compra de computadores e campanhas publicitárias. Com o programa Mulher Viver Sem Violência, que previa investimentos de 222,8 milhões de reais, a pasta gastou irrisórios 13,5 milhões de reais nos últimos anos. Procurado por VEJA para esclarecer o baixo volume de investimentos, o ministério não se pronunciou.

arte mulheres

 

Nos outros ministérios destinados a reforçar a imagem pretendida pelo governo, também não houve nenhuma grande notícia para apresentar. Em abril, milhares de indígenas fizeram um protesto em Brasília no qual dispararam críticas à lentidão nas demarcações de terra, à insistente presença dos garimpeiros em suas terras — a despeito de Lula ter declarado “guerra” aos invasores no início de seu governo — e ao avanço do marco temporal (que só permite demarcar terras ocupadas pelos povos originários em 1988), apesar da posição contrária de Lula e de decisões do STF. Também em abril, Lula reencontrou Raoni, agora na aldeia Piaraçu, no Parque do Xingu (MT), e ouviu críticas do líder caiapó que subiu com ele a rampa. Em agosto de 2024, em entrevista às Páginas Amarelas, de VEJA, outro líder internacional dos povos originários, o escritor imortal Ailton Krenak, foi taxativo sobre o ministério criado por Lula. “Até agora não conseguiu dizer a que veio”, afirmou. No mês seguinte, mais de 100 representantes de três etnias fizeram um protesto no Museu Nacional, no Rio, e cobraram Lula e a ministra Sonia Guajajara por mais empenho na demarcação de terras. Presente, o petista disse que o esforço existe, culpou o Congresso pela lentidão e acrescentou como justificativa: “Sou a única vez que vocês chegaram à Presidência”.

arte mulheres

Pior do que não poder apresentar boas notícias, no entanto, é produzir fatos ruins para o governo. O mais chocante episódio ocorreu em setembro de 2024, quando o ministro dos Direitos Humanos, Silvio Almeida, foi demitido em meio a um grave escândalo de assédio sexual envolvendo a colega Anielle Franco, da Igualdade Racial. Intelectual, negro, comprometido com as bandeiras de esquerda, a ruína de Almeida demoliu também qualquer iniciativa positiva que a pasta, agora com Macaé Evaristo, pudesse produzir. A situação pouco mudou no país. Em março deste ano, Mary Lawlor, relatora especial da ONU, apresentou relatório sobre sua visita ao Brasil e informou, após conversar com 130 pessoas, que “defensores de direitos humanos enfrentam uma situação de risco generalizado no país, com ataques extremamente violentos, estando os grupos mais discriminados em maior perigo”. Na pasta chefiada por Anielle, o resultado não é melhor. Estudos feitos por Dieese, Movimento Todos pela Educação e FGV Direito mostraram recentemente que a desigualdade racial ainda afeta desde o mercado de trabalho à sala de aula, passando, claro, pela violência, área em que os negros seguem disparados como as maiores vítimas.

Não passa despercebido, tampouco, o tratamento dado por Lula às mulheres. Das onze que assumiram ministérios no início (veja o quadro), quatro já foram demitidas, sendo duas delas para acomodar homens indicados pelo Centrão (Ana Moser e Daniela Carneiro) e uma por fogo cerrado desse mesmo bloco político (Nísia Trindade). O presidente também não pensou duas vezes ao demitir a presidente da Caixa Rita Serrano, servidora de carreira, para dar o cargo dela a um aliado do então presidente da Câmara, Arthur Lira. Outro movimento criticado foi a indicação de Flávio Dino para suceder Rosa Weber no Supremo, deixando a mais alta Corte do país com apenas uma mulher, Cármen Lúcia, entre as onze cadeiras. “Na política, o que vemos são mulheres forçadas a defender seus mandatos em espaços de onde são, sistematicamente, expulsas por não se conformar a um ideal masculino para o cargo”, diz Maíra Liguori, diretora da ONG Think Olga.

Pesquisas recentes têm mostrado que a ineficácia nessas áreas em que Lula pretendia brilhar já impacta a avaliação de seu governo. Pesquisa Datafolha mostra que o apoio ao petista entre os pretos caiu de 43%, em março de 2023, para 29%, em fevereiro deste ano. Já levantamento da Quaest de março aponta que a reprovação no eleitorado feminino chegou a 53%, superando a aprovação, de 43%. O movimento é relevante porque as mulheres ajudaram muito o petista a derrotar Bolsonaro. Na véspera do segundo turno, o Datafolha indicava que ele teria o apoio de 52% delas contra 41% do rival — o que foi decisivo numa eleição em que a diferença entre ambos foi de apenas 1,8 ponto percentual. Na campanha eleitoral, não faltaram declarações sobre a urgência de medidas para combater a violência de gênero. “Depois de quatro anos de uma Presidência marcada por retrocessos, as mulheres esperavam mais avanços concretos e menos luta para preservar os direitos que já conquistaram”, avalia Bárbara Libório, codiretora do Instituto AzMina.

O fato é que a nova ministra das Mulheres assume o cargo com os mesmos problemas deixados pela antecessora e menos tempo para solucioná-los. O desafio imediato é ajudar a melhorar a imagem do governo, arranhada pela ineficiência e por escândalos variados. Será um desafio e tanto, posto que movimentos do Palácio do Planalto andaram na direção contrária das promessas embutidas na famosa foto na subida da rampa do dia da posse de Lula.

VEJA

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