O piloto sumiu! Como negociação técnica não funciona, Haddad passou o manche para Gleisi e Costa
Enquanto isso, Lula continua voando, no mundo da lua, fazendo demonstrações de juventude em Paris, gracinhas no G-7 do Canadá e agindo como se nada estivesse acontecendo
Numa semana de guerra entre Israel e Irã, BC elevando os juros a 15% ao ano e Congresso impondo três derrotas ardidas ao governo Lula, o piloto da economia brasileira sumiu! Não importa se com bons motivos ou não, o fato é que Fernando Haddad parece ter cansado, tirou férias e empurrou o manche para Gleisi Hoffmann e Rui Costa. Apertem os cintos!
Haddad errou no anúncio das mudanças do Pix e teve de recuar, errou ao taxar o IOF sem debate e negociação prévia e teve de recuar e errou ao assumir uma alternativa técnica antes de ter garantias da cúpula da Câmara e do Senado. Vai ter de recuar? O presidente Lula diz que não. Porém, como a racionalidade não funciona, Haddad jogou o pepino para Gleisi, que foi sua grande adversária na presidência do PT, e Rui Costa, que continua seu maior adversário no Planalto.
O ministro da Fazenda está esgotado, esgotou as possibilidades de negociações técnicas e convocou a “área política” para cumprir seu papel e negociar com o senador Davi Alcolumbre e, particularmente, com o deputado Hugo Motta, que se transformou numa síntese ambulante do que ocorre no Congresso: o Centrão está se desgarrando do governo, descambando para a oposição e se tornou o grande responsável pelas derrotas de Lula.
Fiel da balança, e não é de hoje, o Centrão manteve um pé no governo (e em vários ministérios) e outro no bolsonarismo. Ao sentir que os ventos sopram contra Lula e a favor de um bolsonarismo ainda difuso, não teve o menor pudor – como nunca teve – de pular de barco. Aos ventos e privilégios, tudo! Ao País e à lealdade, ah!, deixa prá lá.
Em sequência, a Câmara aprovou urgência para derrubar o pacote do IOF, o Senado derrubou doze vetos presidenciais e, em seguida, Alcolumbre leu o pedido de instalação da CPI mista das duas casas que, oficialmente, é para investigar a roubalheira de aposentadorias e pensões do INSS – o que seria salutar −, mas qualquer torcida sabe que, na prática, é para azucrinar Lula e o governo.
Resumo da ópera: o Congresso se coloca como o grande defensor do equilíbrio fiscal, mas derruba todas as propostas para aumentar a arrecadação e ainda por cima aumentar o gasto -- de preferência, os próprios gastos ou os que interessam aos lobbies mais, digamos, azeitados.
Ao votar a urgência contra o IOF, o Congresso não apresentou uma única alternativa para sustentar a receita. Ao derrubar os vetos de Lula, deixou uma despesa de R$ 197 bilhões (R$ 7,8 bilhões ao ano) na energia e outra, de R$ 164,8 milhões a mais, ora, ora, para o fundo partidário de suas excelências. Por fim, deu o bote da CPMI na “hora certa”. A ideia, lançada no primeiro dia das operações da PF, foi empurrada com a barriga com as revelações sobre as responsabilidades também do governo Bolsonaro e só agora é concretizada -- após as pesquisas mostrarem que o ônus caiu mesmo foi no colo de Lula e do atual governo.
Se o piloto da economia sumiu, Lula continua voando, no mundo da lua, fazendo demonstrações de juventude em Paris, gracinhas no G-7 do Canadá e agindo como se nada estivesse acontecendo. “Se eu for candidato, é para ganhar”, disse no feriado ao podcast Mano a Mano, enquanto Tarcísio de Freitas comemorava o aniversário de 50 anos enrolado na bandeira de Israel e cantando para uma multidão espetacular na Marcha para Jesus em São Paulo. Sei não.
Eliane Cantanhêde - Estadão